Aos irmãos Couto, Aqueronte, Estige
através dos quais o barqueiro Caronte atravessa almas
i
Cocito, estuário das lágrimas
dos homens ruins e pecadores exímios
rio de crivos curvos e metálico lamento
afluente do Estige medonho.
ii
Jovem ginete o efebo Aqueronte
voluntarioso e de brio redobrado
um dia deu de beber (água sedenta de ébrio ode)
aos ardentes titãs (desidratados heróis)
rebelados golpearam o General Júpiter
este em represália ao gesto piedoso
transformou-o em rio.
iii
A ninfa Estige filha de Tétis e Oceano (de estirpe aquilésia)
asseda de Júpiter na revolta titânica
foi por ele metamorfoseada em rio
de águas poderosas.
iiii
Cortando águas paludosas, ondas geladas, convexo e abisso
silenciosamente sulcado por arados escuros
num vai e vem contínuo, recôndito, lascivo
vai barca arrombada, suja apodrecendo
negra como graúna, gonorreica, truncada, sebenta
a transportar almas vis (inominadas sombras)
que despiram o véu vital da carne
e desesperadas esperam no umbral do cais terrível
a passagem para a outra margem do inferno definitivo
(da margem virtual da vida para a real do fim).
O barqueiro coxo, ríspido, cuspindo sombras de vespa.
é o alfandegário quasimodo Caronte.
divindade úmida e fecundante
de cio opulento e maviosas ondas (quais seios)
habitava beiras do inferno
seu sítio habitual e clamoroso
(onde todos desaguamos, rios humanos)
iiiii
Arrastando rochedos, êmbolos sublevando
usina de vórtices como se de moinhos se locupletasse
viva correnteza de uivos e histéricos esgares
marés de magestoso enxofre impelindo sem trégua
bacias de fogo em levante das margens opressoras
o barulhento, fumegante e escamoso Flagetonte.
(piriflagetonte, no ardendo, corcel de incêndio
a severa pira hídrica, hino ígneo, garganta líquida)
ao lado dos camaradas ínferos (Couto e Aqueronte)
águas comungadas num só leito paludoso, insalubre, musguento
engrossam o Estige, deságuam num inferno hídrico.