(Poema de linho para Lígia a artista que se foi no tempo em busca de paragens mais brancas)
No céu da tela, luas
De linho bordadas
Com mãos de domingo.
No horizonte cândido,
O sol de alvaiade
Expulso do pincel
E treliças de sal.
No dedo, tranças
De agave cor de neve
E nos dentes místicos do urdume
Orações de açúcar debulhadas
Da bíblia de alfenim.
No âmago, a noite de sisal
Alvejada pela face
Das líricas tempestades
De luz íntegra
(sem tremores de cor
ou abalos de grito)
no todo, a soma
das brandas álgebras
de mistério e alvorada.
Na paz aveludada,
O jogo de cola e elo
De marfim conformando a trégua
E o xadrez apaziguado das espumas.
Na nudez dos condões,
O fio da sina e axiomas do sim
Além da lição solar
Dos arabescos de giz.
Na saia, malhas de arroz metafísico
E cisnes amanhecendo
Nutrindo a candura
No ar alabastrino.
No olho, as tênues redes do tempo
Pescadas pela mão, tocaiando
As horas tresmalhadas
Tecidas na alma e contempladas
Dos alpendres de leite
De onde brotam
As brumas da trama
As alvas caatingas
Os labirintos urbanos.
Na carne alada,
Os gestos lépidos
Dos alinhavos no cetim
Logo flagrados.
Na retina, as cicatrizes falando
Aos habitantes dos alvos sulcos
Das cândidas paisagens
De lã e arame geradas
Da mão celeste com paixão precisa.
Na luz, a sombra láctea
O apuro dos domingos exatos
E o êxtase claro
Na tela marcado.
Na lenda, entretecidos
Aves nubentes
E puros equinócios de brim.
No coração, o branco assombro
A alfombra polar
E aves de linho sangrando
O oceano sem mácula
De Lígia Celeste.