Sonhei um rio esquecido
de margens réprobas
atravessado de talvezes
e adeuses loucos.
E abri meu pântano íntimo
à incúria de meu pensamento torvo.
E senti: infelizes para sempre
os poetas absolutos, posto que (amiga)
a tensão plena do absoluto poema
enfermiza o espírito ordeiro do mundo
o absoluto verso é verme de remorso
(que corrói como rato), obscuro signo
torpe verbo que engana barro, ilude
todo sentimento, alonga dor desconhecida.
Cavaleiros... primeiros...
não é rima... pois o grito é impuro
como o ouro do silêncio
ou ossos de hóstia, ou hostes desonestas de anjos.
Então... poesiAbsoluta não é...
não é deformação do verso.
Nem ordenação do mundo
beleza fácil de ritmos edulcorosos...
é deflação de sentido
não inflação de piedade e sentimento.
Eis que o sonho à sorrelfa obsedia
e eis-me à beira da ínfera laguna
solitária acossado de perdições.
Assim, ebuliça o sangue irado
no entorno do coração
pois a ira avermelha a vida...
veias incham como mortas carnes
intumesce a cólera estrangulada
como víbora ou ebola
irado rubor toma o rosto
da face aflui o lodo (em icto)
o esgoto da fauce avança
pelo corpo presa da alma vândala.
Pálido torna-se o carmim
a ira incandesce estatuto do leitor
desse poema intestino e brutal
cólera ocupa alma amiga
tomba o sal do espírito
encurralado nas palavras (mau)ditas
só fumo se vê ao lado
da névoa viva do verbo enlouquecido
à lateral do rumor que brilha
no interior do verso
se acende a vida
sobre escuro vômito da aparência.
A ira é vermelha destra
a inveja branca cinza.
Romper concórdias e honrar
madeixas serpentuosas, pois, se
leitor óbvio não capta o oculto
sob véu do verso, não hesite... não
retire, não vede a veia poética
absoluta, interrompa torpe leitura.
Não perturbe nem instiga
aleto em repouso incansável
esta mãe dos maus pensamentos
não se increpe à ira vital
de Tisífone de más palavras
nem a tempestuosa megera
mãe do verbo acicate, delas
nascem as crueldades da poesia.
A virgens estéreis não oferte
falo que pulse em ritmo
de verso e senso
nada estranhos.
De ávidas dúvidas ensile o verso
ou conteneízere-se
das águas absolutas da poesia ouça
Aqueronte gerar da noite do verbo
as três filhas que urdem enganos
servas que são da soberba, aias
de Prosérpina rainha.
Busque – amiga da dor da poesia-loucura-lodo
que à poesia incita a esquecer Medusa
busque pois o logro das coisas sabidas
cesse-se... e em Euríale ache
a lata e exata profundidade
da loucura poética absoluta.
Fúrias soberbas e sensatas
do vértice da torre alta do verbo
esperam com o verme do remorso
no vaso aberto como veia
do poema irresoluto.
25.09.17