O amor perverso é maior.
O desejo é uma planta vital
brota, se enrosca, cresce como falo
úmido como vagina doce e ávido
amadura e se abre como bagem.
braguilha, envelope, cona, olhar do céu.
Súbito olhar capta num átimo
ou relâmpago toda
a ambiguidade profunda do universo.
À libertina cerimônia
de corpos penetrando-se
no espaço do amor.
Corpos enlaçando-se
como palavras num poema
coito do verbo em riste
como falo levante
sol do púbis avolumando-se
até o êxtase cósmico da carne
volúpia estendendo-se como uma tarde
no tapete da noite sacrada dos corpos
e das rimas.
Que nus dizem corpos enlaçados de viva lascívia
(se falam ou não emudecem de volúpia farta)?
Aperta-me mais um rosna a outro
(ou murmura cataléptico do gozo).
Não sabes? Pergunte ao corpo
(nunca à água do cio corrente)
fale a sua própria e terna (não torpe) carne.
II
Sei que a inocência olha
corpos em nua peleja. E sonha
um dia duelar selvagemente gemendo
poro a poro, pele a pele, alma a alma
carne em carne a extrair
de cada instante êxtase
lentamente ano a ano acumulando
(no ânus ou não).
Prédicas dos caminhos e veredas abandonadas
indubitável prece salvífica prospera
a palavra errante deblatera
o eco anacorético amplia o nome
a voz nômade do profético deserto
que hebaico eremita desafia e avassala
prédicas em eco e cântico
(onde recorrem o surdo
ditirambo, a maviosa ode e hinos
a maçãs caídas
proibidas amassadas).
Dose elevada de lascívia
levemente umedecida
por macia sede de lábios.
Cemitério de mares
(em cada cais uma lápide)
rápidas tumbas de águas mortas
e estrelas náufragas
cemitérios marinhos
(não franceses)
onde se inumam
gaivotas despedaçadas
e velhos albatrozes descansam
de suas jornadas
naves capitâneas
de quilhas abarrotadas de ostras
golfos e arquipélagos naufragados
aqui jazem junto a mortos oceanos.
Jovem sementeira ao lado
de velho cemitério
com eles se completava
numa palavra.
O beijo é uma perversão oral
advertem psicanalistas
dispara Octavio Paz.
O “cunilingua” é baixo mas profundo
adverte psicanalista competente.
Enquanto convexávamos detidamente
à sombra daquele ícone átomo
(isto é, ídolo de palavras
com alma de cerâmica)
ícone úmido
meio alquímico
(um pouco quântico
talzes)
o tempo discorreu
a hora escreveu a lápide
do instante abduzido por Cronos
... e o discurso se estendeu
ao confim côncavo da página.
