ao mestre e mentor poético
Sébastien Joachim
A lua é uma labareda noturna
acha que Deus soltou no alto
para que brilhe a floresta do céu
vômito de sombra que o rosto
do homem ilumine de alumínio úmido
ou escombro cruel de abril.
Nada talvez volte bem aquém
para o bem e para o mal de alguém
é o que se prevê do futuro moira agora.
Nenhuma atitude do esplendor resolve
a dor que nos equipara a verme ou garça
porque ao homem coube a destruição.
Sei que a garoa compactua
com minha lauta alma de ardor íntimo
e que o frio enaltece-me o tornozelo
e que os topázios do horizonte
não são rosas servis
são querelas e prendas de Deus.
De lição (ou tição) de treva sou perfeito
aprendi coivara num convento
e a arte libidinosa da solitária prece
num tumulto do leito da cama carnívora
entre um olhar e dois abismos
frente ao infinito esquerdo.
A rosa era precipício
dor mandala ou edifício
e o amor morto e enterrado
no canteiro direto da aurora
entre artemísias irmãs
e oboés cercado de antúrio e uivos.
Enfim: a rosa podre sobre a mesa fria
e alma suspensa do abismo que começa.
Infinitos silêncios pascalinos
o grito de Munch abobadado
a clareira absoluta codificada
o extremo grácil do carneiro
a navalha cerce e o nada começa.
Eu esculpi em meu espírito
do barro derrotado frágil agonia
mas a vergonha é infértil na pele
e os cones da abrupta solidão
são estéreis.
As cruas naves do ar ou do mar
não apodrecerão tão facilmente
porque a estrada logo ali termina
e depois só as montanhas do nada
e os imensos vazios
e o infinito silêncio frio.
Ata a melancolia à asa da multidão
e terás a perpétua náusea a teus pés.
Vi a queda e a vi a perda do horizonte.
Não vi meu rosto de mar
e sou o marinheiro Narciso:
Da imóvel imagem guardo
a movediça verdade da margem.
Lembro teus olhos duros
olhar de pedra cambriana
ver de mar sem fim azul.
Que obscuro espelho ilumino.
Onde está graça da morte?
Na desgraça da vida, talvez.
Da vida se busca a mais alta imobilidade
(da proa de uma mesa da bolsa).
Num espaço nu
o vazio pó
e a cinza da última certeza.
Gozo é decomposição
todo prazer é podre.
Só cemitérios não éreis.
Esvaecido fluo para o nada todo.
A infinitude queima, é áspera e lâmina.
O paraíso sem precedentes mas transitório.
O éden é feito de tório.
O céu de amianto e delírio.
Eu confesso: não há estações no inferno.
Valozes meditação acometem-se
como nuvens.
Meses são de silício e os dias de alumínio barato.
O ano de césio.
Visitei, ontem, as destilarias supremas.
Assisti à destilação de almas
nos alambiques da criação.
Só a poesia está antes da palavra
Deus é poeta sete dias por semanas.
(Pois Ele é incansável na poesia).
Nego-me, anônimo nomeio-me:
poeta desclassificado.
Frente a um cubo dissimetrico-me.
Mas não destrincho o poeta argivo
argênteo, carnívoro, polaço, portenho
que disse: de pequenos incêndios o amor.
Até o último entardecer, confesso(-me).