O professor (de inglês, direito e administração) José Rodrigues, de quem sou hóspede contumaz, num lugar pró-paradisíaco, O Retiro das Águias, e eu-VCA – costumamos conversar, drincando uma Finlandia Vodka - a de álcool de cevada de 7 fileiras cultivada sob o sol da meia-noite, e de água de degelo da primavera do pólo.
Papo algum bom tempo a fio.
O que não surpreende (o nosso costumeiro encontro palestral), pois no Retiro das Águias residem ele, a mulher, Dona Sara Jane e os cães Bach e Ravi. E VCA, dez dias a cada mês.
São cerca de 60 hectares que vão do alto de um planalto aos brejos (pântanos, cheios de minações de água), constituindo uma grande reserva (ecológica) particular de MATA ATLÂNTICA (inclusive com uma parte original desta). Toda a cana foi extirpada e cerca de 600 fruteiras, além de matas nativas, comandam com pássaros o espetáculo.
Na parte baixa, rente à estrada (acima dos brejos) existe uma estrutura de hotel ecológico: cerca de 100 apartamentos e condições para receber grandes grupos religiosos ou educativos (também serve de casa de recepções). Grupos com aproximadamente 300 pessoas locam o lugar – com piscinas, salões de reuniões, entretenimento – e eles mesmos (os locadores) organizam a hospedagem e alimentação etc.
Fora épocas cruciais do ano (carnaval, semana santa, São João, Natal, Ano Novo) restam só duas ou três pessoas, além do pai – agricultor de raça – Luiz Rodrigues, Dona Raminha – mãe do professor Rodrigues – e dois irmãos, numa bela casa distante meio quilômetro.
No mínimo, cem dias ao ano, entoco-me ao Retiro das Águias, paraíso para escritores e pássaros. Da varanda do “Hotel”, onde escrevo, avisto pássaros, além da página, em média vinte pássaros, por perto, colhendo insetos, frutinhas e molambos (inclusive capuchos de algodão) para os ninhos. Circulam sem medo e o carnal clarim não para.
No pátio de cima (acima 120 metros) há um páramo, tão alto que se vê a cidade de Joaquim Nabuco em baixo.
É o que chamo utopia em andamento. Prof. Rodrigues (o “rei” da Mata Sul, no dizer do coronel, filosofo historiador e escritor Coronel Reginaldo Oliveira) é um apto delirante, um homem de negócios ecológicos, atualmente ensinando na FAMASUL é um utopista prático, cujo projeto de vida é restaurar a Mata Atlântica. Ele produziu, desde os 10 anos que labuta na direção ecológica apolítica (ecologia real) cerca de 10 Matas nativas algumas infelizmente queimadas – “por acidente”- pelas milhares de queimadas de canaviais que ocorrem anual e sistematicamente há 500 anos, nas Matas (Norte e Sul) de Pernambuco. Além de utópico (e adepto da rebelião ecológica), ele é altamente pragmático e mantém comércio de roupas em Palmares que administra criativamente.
Prof. Rodrigues pratica a deep ecology e despreza todo o besteirol, a farsa e enganação de ecologia política, tipo partidos verdes, marinas silvas.
Mais de trezentas bananeiras e dezenas de jaqueiras, além de outras árvores frutíferas, como goiabeira, mangueira etc, são dos pássaros. Não se retira um fruto delas. Isso – e a rígida fiscalização contra “madeireiros” e captores de pássaros exercida pelo Coronel Reginaldo, com apoio oficial, permitiu o repovoamento da área pelos pássaros (cobras, preguiças, gaviões, tejus etc), que se sentem seguros e põem em cada galho de árvores ninho (macio, pois há algodoeiros bem distraídos para uso de pássaros).
Água sobra. Existem cerca de cinco minações perpétuas, duas de água mineral. E é utilizada desde sempre de modo ecologicamente correto.
Num planalto (que chamo páramo etéreo) o prof. Rodrigues construiu um castelo (com portas, ameias, bruxelas, etc). e no interior – tamanho cerca de 2 campos de futebol – uma casa magnifica, com os quatro lados voltados a panoramas incríveis, pois o local está acima das cidades da região. Lá localiza-se o Centro do Universo, com as devidas coordenadas e uma pirâmide de dois metros marcando o local onde tudo começou. Existe o Círculo de orações (ou de Cura) e um pirâmide de sete metros (cada um dos três catetos e a altura tem 7 metros).
Particulamente, entendo que o Retiro das Águias é o lugar próprio adequado, único para o encontro das pessoas consigo mesmas.
Se você - por acaso ou qualquer circunstância, quiser se encontrar com Você mesmo, marque o encontro lá.
E lá rima com Shangrilá.
Se você não mais se conhece ou perdeu-se nos vários e desvairado caminhos da vida, procure-se e se encontre com você mesmo lá, já.
No início da idade agrícola, a humanidade se agregava em comunidades, não ainda em sociedades, não havia o conceito (alienante por si) de sociedade. Isto é, o homem, não como indivíduos (livres) mas como social (ser fictício reificado). Cada comunidade era autossustentável e todos viviam pacificamente dedicados a si e trabalhando em conjunto, só para prover os alimentos. Todos tinham seu espaço, a necessária porção de solidão, a possibilidade de imersão em seus próprios pensamentos a fruição do ambiente integralmente, o convívio são, a liberdade viva etc.
A sociedade – surgida do escombro da comunidade – destruiu essa real condição humana (pessoal) – e instituiu a condição social (alienante, exploratória).
Surgiram as cidades, feiras tornaram-se shoppings e hipersupermercados, e aglomerados deram causa a regiões metropolitanas. É pouco.
Quando foi teorizado tudo isso, Rousseau – em seu contrato social – legislou a respeito, porém advertiu: o homem deixará de ser livre e natural.
Whitman foi o último bastião de Rouseau, cantando a liberdade do indiviíduo – que Thoreau experimentou. E o legado de Thoreau, ao menos na Mata Sul, Rodrigues perpetua.
Daí, foi só debacle, conflitos, imbróglios, guerras, destruição da natureza, devastação hídrica, queima de florestas, combustão da alma, busca do apocalipse humano, construção do fim.
Algumas iniciativas, como Vale do Amanhecer, vieram, porém todas místicas e nogociais, autoritárias, como as religiões hoje. Alienadora por excelência das atitudes e dos comportamentos libertários, humanos, em si.
Só no Retiro das Águias, é possível (mesmo que este não seja o desígnio do Prof. Rodrigues) ocorrer o encontro do ser com o ser, do si com o si, sem a intromissão (conflitual ou não) do outro (que são o inferno).
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