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Sex, Abr

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Quando digo que realizei votos de solidão não estou sendo retórico ou a fazer blague meramente.

Tive um insight – daqueles que Murilo Gun explica, não Freud. Morei nove meses num Mosteiro de São Bento, usei o silêncio, o deserto, a cela, o cilício, ao sal da contemplação tive acesso. E comi do pão (de místico trigo) e bebi da água monacal. Mais de mil textos produzi em minha jornada de monge (Dom Vital, meu santo protetor, de quem era devota minha mãe, e dela tenho a estátua, cheira de máculas do tempo, dele).

 

Os lugares seguintes detinham aspectos e qualidades do mosteiro.

se realizou como ser – como eu e VCA. Nós somos como que um multiplicados por dois, noves fora todos os tudos do todo.

Fui para dentro de mim, num coito interior estupendo – e continuado. O caminho a si (mim) encontrei: o tao vital. A busca do centro místico do ser terminei por findar. É preciso ir para dentro (do útero da terra viva, da vagina que uiva do mundo). O dentro de si mesmo é um lugar em (ou a) que poucos foram.  É o eu capturado de modo vital, captado em sua inteireza e maravilha, no âmbito de um sentimento de simpatia com todo (qual seja). É participar de uma comunidade do espírito. E da plena solidão desse espírito. Pois, não há espírito multitudinário.

E o que mais surpreende. A cabana, provi-a de fogão de lenha (tenho madeira comum, galhos etc) e foguareiro e chapa a álcool, pois não uso gás. No entanto, há 6 meses não os uso. Porque comer não é mais prioridade ao espírito. E os 15 quilos a menos o atestam bem. Água pura de minações (cacimbas como a da várzea São José em Vertentes e do sítio Frecherinhas de meu avó, poeta Manuel Florentino).

Quando adentro tais lugares, ponho-me extático... e começo a jornada do escritor, tal como me ensina Gun, à base de Campbell.

Vivo (e habito) a comunidade do espírito, na acepção de Novalis para tais situações, e que ele – geólogo místico – viveu.

Em suma, fui (VCA) ao encontro do id vital – e o encontrei, encontrando-me.

A solidão é meu rico elixir, é minha dádiva, meu cajado, minha casa.

E quero partilhar tal com quem ainda não se achou nas estradas intransitáveis e traiçoeiras da vida grupal. E vida é corpo e alma amalgamados.

Os responsáveis, por eu me isolar do lamento urbano, das lindes do comércio me afastar, me marginalizar da aridez fria e populosa dos shoppings (resido em Boa Viagem, a 15 minutos a pé de dois shoppings  - Recife e Guararapes), foram Stefan George e Trakl, poetas expressionistas alemães, cuja poesia conheci quando estive na Alemanha em 1996. No ensaio, Anos expressionistas, de certo modo extenso, trato de todos os poetas expressionistas, e trago ótimas traduções de George e Trakl (que fiz do espanhol), e publiquei na minha revista Singular, número 4.

Aprendi vida com eles, e, com Nietzsche, aprendi viver. Ouço no silêncio rural o canto do cacto que cultivo a cabana isolada, dentro do mato verde, é uma espécie de mosteiro, uma confraria estabelecida entre eu e eu mesmo (que nada aborrece ou interrompe). Só eu, o pântano, o capim aquático, o sapo e o céu longínquo cristalizado de estrelas. Sou CC: contra convenções (inclusive as de alimentação), contra o pensamento utilitarista e reacionário (metafísico) e contra o racionalismo vazio... e contra o decadente estágio do pensamento brasileiro (e intelectualóides, como os cunhas e os aécios da vida ignara).

Por que Nietzsche? Ele inspirou ou deu foros de cidade aos movimentos artísticos do século XX: simbolismo, art nouveau, expressionismo, surrealismo, cubismo etc. Ele não se dirigia à razão e à fantasia, mas à natureza (de Deus, do homem e do mundo).

O eco de Nietzsche provocou o irrompimento místico real, a introjeção de uma nova mística do tempo contra a racionalização mecânica e industrial, que aliena e apequena o homem, com o álibi de que vai alimentá-lo de hambúrgueres e gorduras vitais.

Me sinto partícipe de círculos cósmicos, como uma espécie de receptor via verbo, esse vinho tinto e sonâmbulo que me afasta do meio medíocre do mundo. O pleroma dos gnósticos é minha figa.

A irrupção místico dialética de que fui possuído, há 3 anos, me acolheu e me guiou. A desprezar e combater, a verberar contra a crise da decadência da linguagem e do pensamento brasileiros (Brasil que ainda não tranpôs o marco do 3° milênio – e jaz atrasado, nessa idiotia que a crise política representa).

E uso a palavra poética indizível para dizer aquilo que supostamente não pode ser dito, porque à mediocridade organizada doe.

 

Murilo Gun

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