(em forma de crônica)
Morri ontem ao raiar do dia
A manhã ainda pássaro fora
Claridade estraçalhando-me lentamente
O sol apenas anunciado por clarões vazios
Eu que nasci num domingo
Dentro do córrego de minha mãe
Ante meu pai extático e a perícia do Tio Emigdio
Obstetra, morri
Em Recife
Não sei quando, como, por quê
Morri na solidão enregelada da metrópole
Anônimo como uma barata melancólica
Sitiado de silêncio árido e flores convulsas
As avenidas me viram morrer
E não sorriram
O enterro, procissão de nervos, prantos, poeira
Suores, rumores de barro e frieiras foi intranquilo e crasso
Ao baixar ao sepulcro senti
Cimentos pesarem em meu rosto
(e o espíirito desvencilhar-se da terrível armadura
da armadilha terrena, tomar ares de pássaro
longe dos reinos subterrâneos)
Dístico servia de marca na lápide de surdo mármore
“não obteve salvação pela poesia, felizmente!”