à morte, potência maior da vida
e realização final do homem
A volúpia do ser é morrer (última rima vital).
O êxtase da vida é morrer.
A perspectiva do tempo é a morte.
O começo do vazio da eternidade é a morte plena.
A hora da morte é o auge da vida.
O tempo é a morte .
O homem se projeta na morte.
A cova é outro útero. Mais fundo.
Maior. Eterno.
Morrer é ilhar-se (para o ser apodrecer em paz).
Estoica ou cristã a morte é a mesma.
Morte. (E norte da vida). Incerta e certa.
Trânsito definitivo.
Parte indistinta da vida.
Algo que se (nos) completa.
Complemento radical da vida.
Outra e mesma esfera.
A morte é tangente à vida.
Fruto da igual geometria da vida.
Filha do mesmo geômetra Deus. Fiel.
À vida e à morte. Irmãs Nele.
Audaz é o futuro.
A poesia absoluta toca a audácia do futuro
quer cantar contra o temor
quer afrontar o horror (da rima em or).
É canção de elétrons (em pulos e atos últimos)
balé em torno do ônfalo do ser, dança cósmica de partículas
implosão musical dos núcleos, físsil
e melodiosa aventura do coração das coisas
fugazes ou não, partitura de galáxias e abelhas
certeza absoluta de que Deus é Verbo.
NOTA: A poesia relativa até agora aqui (no BR)
tem cantado o êxtase silábico e imposto
o limite do cálculo e o crivo dos sons terminais
(rima tipo fúnebre com ubre, púbere com úbere
tubérculo com tuberculose ou impigem com esfinge)
como prêmio empedernido.
E levado À imobilidade do id ao cúmulo
e à emoção do ego ao pódio
(ou mesmo ao sono solto e alto
- de que todo tédio se possua.
Obs) A internetinização da vida
como a sonetinização da literatura (esquizofrênica)
também tem a ver com a imbecilização do mundo.
Não filosofe, ao sentir a morte
se aconchegando a seu rosto (restos)
sobre pó, cuja podridade movida a vermes (raivosos
famintos, macios, metafísicos, mas
filosofe sobre o não-ser
a não-essência, a inessencialidade total
que V. será logo, logo... veja – veja-se
bem na inexistência, inexistindo doce
ou cruamente, mas, mesmo insendo, com uma ponta ainda
(quem sabe?) do insido que fora. E mova-se nessa
imobilidade suprema. Inexista-se... e
seja feliz (ou não, tanto faz para
sê-lo ou não...).
Aquele potro melancólico era o poeta
nahara da palavra disparando
como um relâmpago do céu sonâmbulo
como um verbo de barro
na mão oleira castroalves
ou na mente ágil das agudas águas
dos versos satânicos de Augusto dos Anjos.
Aquela palavra posta como pasto da linguagem
na página útero do verso era
como aromas comungados
na solidão das narinas.
Como um touro morto na tarde também morta
poeta edifica verbo
e do mourão da vida o eleva
à incrível potência de estrela.