A palavra quer viver
sempre livre (em puro mênstruo de ser fruto divino)
fora dos dicionários, presa dos sentidos claros
dentro do poema, solta, alvo da metáfora
do dessentido, da proliferação dos fins
foge do vulgar, do óbvio e pleno, do comum substantivo
(do ego vai ao vago do id, centro do mundo) vai
ao adjetivo do início, busca a luz
fautora, abre veia da vida unívoca
dos inúmeros vis conceitos lógicos e surdos
vai ao magnânimo ambíguo
(de que vive sua carne létrica, sopro rude de barro)
vai ao febril vertiginoso auge mortal
escapa de todo (o) perecimento
laços, liames, jugos, efusões, tramas, cópulas, redes
enlaces, esponsais, conúbios, nós
lentos alinhavos, vastos chuleios, abraços
ligas, atos, algemas, conchavos, leis estabelecidas
pelos deuses que nomeiam o mundo
escoimar-se de tudo (do todo) o que seja frágil ou fértil
cego, decrépito, cômodo, unívoco, cívico, langue
depauperado, inerme, anquilosado, esclerótico
roubar-se de tudo (todo) aquilo que seja válido, anêmico,
agachado, héctico, tísico, rimado, adjetivo, desávido e desvalido
epidérmico, avariado, inocente, aviltado, pobre, fático, adjetivo belo
em suma, não poético, não enviesado, puro.