Minha voz é sal alevantando-se
duna branca que a tireóide acalma
lua de cócoras, pâncreas enlevado
raiz do céu dentro da garganta
minha voz é uma rua de Istambul na primavera
uma fuga do esôfago para a cela da alma
a palavra revascularizada
sintagma afrontando banalidades
cães vocais estraçalhando silêncio aberto
vorazes panteras contra a palavra adentre
minha voz é um céu sem madrepérola
que concha e mãe da pérola acostumaram
minha voz é torvelinho lento de abelha
catilinária contemporânea adigitálica
o amplexo da página
o rascunho da alma
minha voz é um esteiro, peleja, ato
crucial da palavra enlouquecendo
no palco da lauda a degolar hamlets
e a ela se aderem nosocômios e baratas lusas
minha voz hímen da hermenêutica
preserva, selo apocalíptico sabota
se viola exegeses, ama perplexidades leitorais
se rechaça rimas velhas, adota pose de verbo
é um gozo e uma declaração complexa (e perplexa)
larva de abutre, ato de treva minha voz
cadáver alevantando-se contra a pátria do caixão
roupa alevantada contra eitos de mortalha.
Minha fala estende-se do limbo da página
ao lençol frenético da alma
como um morto dentre do túmulo
ou pássaro dentro da pedra molhada
falo de levante e de baixios
não falo de aves, encantos pueris, cílios postiços
como posturas municipais ou transcendências ocas
banalizando a palavra carne
o verbo domesticando ou enevoando
o leito do sintagma quanto
falo do êxtase alevantando-se
cativar espírito luxurioso.