24
Qua, Abr

destaques
Typography
  • Smaller Small Medium Big Bigger
  • Default Helvetica Segoe Georgia Times

Minha voz é sal alevantando-se

duna branca que a tireóide acalma

lua de cócoras, pâncreas enlevado

raiz do céu dentro da garganta

minha voz é uma rua de Istambul na primavera

uma fuga do esôfago para a cela da alma

 

a palavra revascularizada

sintagma afrontando banalidades

 

cães vocais estraçalhando silêncio aberto

vorazes panteras contra a palavra adentre

 

minha voz é um céu sem madrepérola

que concha e mãe da pérola acostumaram

 

minha voz é torvelinho lento de abelha

catilinária contemporânea adigitálica

 

o amplexo da página

o rascunho da alma

 

minha voz é um esteiro, peleja, ato

crucial da palavra enlouquecendo

 

no palco da lauda a degolar hamlets

e a ela se aderem nosocômios e baratas lusas

 

minha voz hímen da hermenêutica

preserva, selo apocalíptico sabota

 

se viola exegeses, ama perplexidades leitorais

se rechaça rimas velhas, adota pose de verbo

 

é um gozo e uma declaração complexa (e perplexa)

larva de abutre, ato de treva minha voz

 

cadáver alevantando-se contra a pátria do caixão

roupa alevantada contra eitos de mortalha.

 

Minha fala estende-se do limbo da página

ao lençol frenético da alma

 

como um morto dentre do túmulo

ou pássaro dentro da pedra molhada

 

falo de levante e de baixios

não falo de aves, encantos pueris, cílios postiços

 

como posturas municipais ou transcendências ocas

banalizando a palavra carne

 

o verbo domesticando ou enevoando

o leito do sintagma quanto

 

falo do êxtase alevantando-se

cativar espírito luxurioso.

 

 

 

Murilo Gun

REVISTAS E JORNAIS