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Dom, Abr

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            Mallarmé, Valéry, o grande Wordswort e, em geral, os poetas simbolistas sempre afirmaram que o poema não deve dizer, explicitar, informar ou descrever diretamente, mas sugerir.

            A palavra sânscrita “dhvani” (que colhi de um alfarrábio VCA antigo), que parece figurativamente com devaneio, desvario, significa ressonância e pode ser traduzida por “sugestão”.

            Hoje, sugestão teve o seu significado (conotação) purificado, perdendo as ressonâncias vinculadas à hipnose (que implica perda de consciência) e à persuasão (influenciar o outro etc). Porém, guarda ainda um resíduo do sentido de insinuação.

            A poesia absoluta se alicerça profundamente na sugestão. O sugestionamento que acompanha o verso é vital, até mesmo em termos curativos (e não só criativos), estabelece um princípio unificador novo que influi na mente do leitor desperturbando-o, inclusive, ativando-o, em função do verso complexo ou hiperverso da poesia absoluta.

            A poesia organiza uma espécie singular de malha cerebral, induzindo novos significados e subsignificados. Não se trata de comunicação imediata, informação poética, mensagem evidente, clara, definitiva, mas de essência arquetípica, original, que a poesia deve propiciar.

            Se leitor resiste à comunicação imediata, não mais exigindo-a, em termos de recado, mensagem (política, amorosa, sexual etc), e se expõe à profundidade do signo e embosca-se nas árvores da essência, fugindo das selvas da aparência, sobrevive ao teste da poesia difícil. É ridículo quando alguém folheia um livro meu e sapeca: eita, tem que ter um dicionário de lado. É a coisa mais idiota que alguém possa dizer.

            A poesia absoluta traz uma intertextura em A: amétrica e assimétrica (que inclusive rima). Pois o metro cancela a imaginação, interrompendo o processo criador, com os  dedos contábeis. Troca-se o insubstancial pelo material vulgar.

            Por isso a poesia nos capacita mais que a prosa para conceber a vida sem medo, suportar adversidades fantasmas, fugir do existir aterrador a que a pessoa comum – e analfabeto em poesia complexa – se submete cotidianamente.

            Ao se desviar da comunicação imediata do verso complexo (hiperverso bom) o leitor lança mão do cérebro que, desafiado pelo poema hermético, multiplica, neurônios para vencer o desafio da hermenêutica verbal.

            Há um descargo da inconsciência. O leitor, ao se desincumbir do entendimento direto do poema (sob pena de não ser poesia metrificada, rimada, romântica, clara), imerge numa dimensão nova, em que a poesia age, estimula a mente, sugere, desbrava, amplia horizontes exegéticos, liberta a imaginação das peias métricas e rímicas. E se realiza, vai além do potencial que o limitava.

            Eis o papel criador e curador da PA.

Murilo Gun

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