03
Dom, Ago

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Em Alemão, id é “das es” que significa isso ou aquilo.

Freud e seus seguidores observavam crítico e criteriosamente a reação de pacientes que oralizavam subitamente sintomas, atos, reações, e explicavam: “aquilo foi mais forte do que eu “ou” isso me veio de repente”. Essa coisa misterioso, selvagem, irrompendo do súbito, de dentro, centrípeto, mais forte do que o eu, a pessoa consciente, o paciente. Isso ou aquilo inusitados tornaram-se, constituíram o ID, forças desconhecidas e indomáveis que nos vivem. Grande reservatório da libido ou energia pulsional (de vida e morte). (A energia usada pelo Ego é retirada desse fundo comum, dessa bacia ou reservatório de ímpetos, sombras, êxtases e dores ou êxitos e temores).

 

Segundo Nietzsche, é o que há de não pessoal e, por assim dizer, de necessário por natureza no nosso ser.

Algo (poético) que vive em nós, enjaulado e livre, maior que a alma, ou mil mares, sob a forma do eu dessexualizado e sublimado. Em alemão, das ich=ego, das es(isso)=id. Em hebraico, ish=homem e isha=mulher, curiosidade.

O ID é uma região, um processo, um dínamo, uma usina de força psíquica, com alto potencial expressivo, não limitado por espaço, tempo, matéria, dotado de uma lógica especial (quase dialética) que se introspecta. E a poesia é uma forma de abordá-lo, dele extraindo potenciais expressivos insuspeitados – e puros como a neve ou o hímen. A poesia é um modo de atualizá-lo, trazê-lo até nós (e até vós, leitora empolada enjaulada no ego e dominada pelo superego – o grande outro de Zizek lacaniano).

A escavação do ID revela riquezas sem conta. Além dos impulsos recalcados (Freud), além das características arcaicas (Jung), novos conteúdos se revelam pela introspecção das percepções cognitivas profundas camadas noológicas e registro (ou pegadas da alma) de vidas ancestrais. É também o reino quase inviolável dos arquétipos que padronizam e modelam escusamente e de forma meio inconsciente nossas vidas, mesmo deformando-as.

Jung, no ID (na sombra, arquétipos), encontra fatos, não teorias.

Abordar o ID é um modo de ir a dentro do si. A poesia promove a retrospecção do id. E também o introspecta.

Estratos de ordem psicológica, psicofísica, psiconoológica e psicossocial estruturam o ID (de sombras vivas e surdas alicerçado).

O ID é um comandante nas sombras (sombras que Jung conceituou, pesquisou e deu certo rosto). Saber algo das decisões dele, do ID, é importante. E a poesia é um instrumento para tal. Ou assembleia que reúna, em torno da mesma mesa da mente, ID, EGO, SUPEREGO, e o leitor (o grande outro de fora do poeta).

Sócrates, com seu “conhece-te a ti mesmo” induzia uma autoabordagem mental, um tipo de conhecimento não-objetivo que denominava de maiêutico ou parto do espírito. O autoquestionamento levava ao conhecimento.

Freud figurou o ID semelhante a um iceberg. Ou seja, o terço visível é a consciência (ego) e os dois terços submersos na estrutura cerebral compõem algo recluso, misterioso, incansável, abstrato, um potencial imenso, uma energia formidável, algo que tem similitude com as subpartículas (os quarks) imersas no núcleo do átomo (este seria a consciência, o id o universo quântico, subatômico comparável, mutatis mutandis, ao universo (cosmos).

A contribuição de Freud, o descobridor do ID: conjunto de processos dinâmicos, composto de desejos recalcados e libido (esta um reservatório de energia psíquica quase insondável). Jung: o inconsciente coletivo habitado por arquétipos, matrizes ou padrões arcaicos provenientes da ancestralidade (animal) humana. Para ambos, o ID precisa ser aflorado ao consciente pelos métodos e formas que pregaram. E é ao que se propõe a Poesia Absoluta. Sua meta, seu leme. Crivo, fulcro.

ID é o mais novo título poético de Vital Corrêa de Araújo. Edições BAGAÇO e IDEIA. ID traz prefácios inestimáveis, lúcidos, mesmo científicos e eminentemente literários de escritores especialistas: romancista e psiquiatra, Professora Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque; jurista, economista e escritor, professor Roberto Cavalcanti de Albuquerque; psicanalista e poeta, jornalista Osman Holanda Cavalcanti e Admmauro Gommes, Professor de teoria literária da FAMASUL.

Nota: ID vem do latim. É a tradução de Isso (Das es em alemão), advinda de Freud.

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Murilo Gun

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