A um anjo de barro peço areia guarida
a largo inferno caminho de casa
à forma do pão desvarios de trigo
a palavras idólatras liturgias líticas
a verões blasfemos sol de satã
(ou de Bernanos perdão por escrito)
a invernos de Jesus verão farisaico
indevoção por mina alma cão
e se não mais direito tenho a Deus
que a verdade morra em minha mão.
Que nenhuma morte se orgulhe de mim
e em seu medonho lugar não me registre
sempre não me aliste discípulo a sombras
que a morte morra mas não alcance
o poeta ou a palavra, que erre a alma
ou deslize na terra estranha e solitária
em que vergasto a vida em solidão
com a árvore e comunhão com o verbo
que os ossos não cedam ao cansaço
ou descaso do cálcio... e nem mais
me sujeitem os maiores a venenos diários
acasos, faods, sinas, destinos falsos
estações enfermas, baixos salários
a messe do capitalismo pecado rejeito
vanglórias não me atentam, não me
contentam paz e suor pagos, enfim
morrerei sem mim.
A morte morre um pouco
a cada bom gosto, a cada limão novo
a morte morre um pouco
a cada sopro que a varra
a cada circuito que a perca
a cada perda que se lhe negue a vida.
Dor, pregue na cruz
com prédicas de Vieira, santo
da palavra irmanada
santo do sermão da saudade
vernácula e eterna como tudo ou nada.
Não mais judie de mim o medo
de não ir a lugar algum
se nenhum sítio existe está em mim.
Amor, estranho amor, não louves
a mim servo da carne sutil
adepto do fogo varonil, possesso
de comerciárias virtudes, egresso
de dinastias sem ventre, omisso
com o tempo e a memória das dores
sem perdão, desculpa, castigo
com as vestes vis da alma em riste
apenas poeta lítico e escasso
apenas tão frágil como o homem.
Ardis não afiam a dor
nem a adormecem, apenas
a afiam e multiplicam como homens
em coitos ensurdecedores ou calmos
a reproduzir-se como ratos
indomados e aborrecidos porque
apenas engajados na virtude de quantidade
na aventura do jorro conjunto
de sêmen e náusea
de gozo e fuga em direção
ao nada de que viemos
para o último nada definitivo.
E a dor reluz no sentimento amorfo
e esplende no leito de agonia
não resistindo à tentação da larva.
Dos becos esconsos escorre som turvo
e ambições vazias escorrem como sais
para formar lodo e sol, sino
que o sopro da esfera desonra
trombetas defuntas, ameias corruptas
se agua e fogo morrem
porque ficaram sois ou farturas
que não da cegues árida
do escuro da sombra viva
se fome, febre, lucro ou amor morrem
e em pranto se desfaça o espírito
então... por que o que exceda fique.
permaneça o que se supõe eterno
se mantenha a meada do meio-termo.
Ossos escuros, índices degradados
carnes enlatadas, discos ulcerados
bolsas rompidas, bolsos fechados
como punhos no rosto da náusea.
Rumo à morte do eterno sigo
prenhe de que a vida é um muro
sem sombra de areia desmoronado barro
turvo como a eternidade
ao eterno turvo senão ermo sigo
alto como ereto pássaro
que além do poente encontro
pouso infinito sempre... e que
imã nenhuma suspenda
a ferro e fogo ou não
a fé do coração
eu a manda verbal
na página da alma vital.
Não vivo ou sinto a vida senão palavras
vazias de um tempo sem têmpora ou ardor
como açor vejo o mar aberto de mim
e ouço as asas do tempo fechadas
o círculo que se abre escuto
como se soubesse ouvir conchas
embora queira a última fronteira
dobrar sem medo, temo
não distender o arco... e a seta morrer
em minhas mãos atadas pelo liame ávido
como ao poema vou persegui-lo
anos sem luz viajando
trevas a apontar o mais claro
dúvidas a interrogar o sal
embora não mais saiba
pensar ou sentir o certo
ou ser só um vaso vazio
como sou.