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Está-se a descortinar a 6ª revolução tecnológica da era contemporânea da pequena história humana (cheia de vicissitudes, aventuras, desventuras e crises de dor).

Desde a indústria à base de vapor até a atual sob o signo do urânio, da mecânica física (newtoniana) à quântica e à eletrônica nano. Até 2045, vislumbra-se outra magnífica revolução da alma (a 2ª, após Jesus).

 

A poesia do século XX (ou a partir de 1880) iniciou uma revolução humana, interior, não captada no Brasil. A viveram Chile, Argentina, Uruguai, (de Benedetti, de Laforgue e Ducasse) Peru (com Vallejo) – e mesmo Colômbia de Gabriel. Como o Brasil vive de um único nome, o maior, o melhor, o imbatível e supremo Machado, perante o qual todos são inferiores, passamos em branco (e bem longe o Nobel).

Sou, de certo ângulo, valéryano. No livro Só às paredes confesso, imito o poema: ‘’Mas eu, amado Narciso, não sou curioso senão unicamente da minha essência; qualquer outra não tem para mim senão coração escuro qualquer, outra não é senão ausência’’. De Rilke, chupei algo alicerçado em: ‘’Embora o reflexo do lago possa muitas vezes desaparecer – e a lua desingravidar, aos olhos de todos, nunca deixes, amiga, de aprender o símbolo’’ (de Sonetos a Orfeus). E foi de Rilke também que veio: A vida dura o tempo queda.

Porém, foi o gênio inglês, née USA, Thomas Stearns Eliot, que reavivou e dialeticamente ultrapassou a tradição literária e decadente e superou-se ao escrever Terra Desolada (Waste land, de 1922), em que refletiu e refratou a crise política e espiritual – e em especial ética gerida pela sociedade burguesa...  que se prolonga até hoje, com um tipo de capitalismo sem peias, em que o cultural é apenas fenômeno, pele, não alma de um povo.

A formação intelectual de Eliot, fincada no espiritualismo luterano e católico, alicerçado nos valores vitais da velha Álbion e no mercantilismo protestante ianque, operou como catalizador de uma visão poética avançada que, em Terra devastada e Quarta-feira de cinzas, antecipa a crise contemporânea que se vive.

É de Waste land: ‘’A terra desolada, ressequida, que é a presente civilização (burguesa e inconsequente, mesmo desvairada de usura – VCA). Na cidade irreal na fosca neblina (fog da alma) de alba invernal, multidão fluía na London Bridge, tão numerosa que eu jamais pensaria que a morte tantos tivesse dissolvida, suspiros breves eram exalados, e cada qual fixava os olhos, na terra inútil diante de si. Vi lá alguém que conhecia e fi-lo parar, chamando-o: Stetson, tu estiveste comigo nas naves em Milazzo e aquele cadáver que plantaste ano passado no jardim começou a germinar’’.

Stetson é um inglês comum (a que Eliot associa sua presença à batalha de Milazzo, no ano de 200AC, ganha pelos romanos na 1ª guerra púnica, guerra comercial e de conquista, como a de 1914 – que Eliot viveu). Quer o poeta dizer que todas as guerras imperialistas são uma mesma e contínua guerra (de moeda e sangue), sempre repetida e da essência das civilizações comerciais – e de rapina.

Vivemos uma civilização decaída, exausta, esvaziada de valores morais e culturais. E a poesia absoluta está a escrever o espitáfio de nosso tempo, na lápide da página, a ser pregado num lento cemitério de lince.

É a PA sem dúvida uma poesia decadente, mas tem consciência (ou inconsciência idítica) de que é a última e necessária floração poética na terra arrasada que nos legaram. Em que o crime é virtude. Terra dos círculos adulterados e ângulos moribundos como os olhos. Que se debruça sobre tempo corrupto.

Terra devastada equivale – mutatis mutandis – à Estação no Inferno. Árida estada do mundo. A assistir à perversão do amor, na vida civilizada de maníacas porcelanas e ágios generosos.

O amor devorador (de e a Cristo) pereceu, em nome dos valores civilizatórios da usura. Vide Pound.

História da civilização ou da depravação e corrupção humanas? Sifilização?

Em suma, Eliot canta o tempo vão, que se prolonga em antes e depois das guerras comerciais e de dominação e anexação territorial (vide Putin). Estar consciente de que se vive e no melhor dos mundos parnasianos é não estar no tempo. Estar crente de que a vida é um acidente bursátil é não estar em nenhum tempo.

E onde estamos? A poesia absoluta dirá!

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Murilo Gun

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