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Por razões que nem o coração conheça, uma certa maneira poética voltou à moda no Brasil, após passada, restaurou-se açodadamente e ficou, permaneceuna moda mesmo sem ser moderna, um tipo de novidade anedótica ou uma situação anacrônica aceita em face do despreparo de todo um povo para a literatura (poética). Nisso se revela um traço forte de submissão, de imposição, de motivação ideologia para permanência e triunfo (retriunfo) de uma forma poética cômoda, neutra, afável, “lírica” ou bem liricizada (a diferença v.g. de Augusto dos Anjos), que desarme espíritos, suspenda a evolução, congele o gosto (retroativo), impeça prospecção (via retrospecção atenta).

Isso é um certo manejo ideológico (consciente ou semi) que permita a novidade passageira (os concretismos) e sonegue a diferença ou inutilize o futuro, sempre imprevidente e tumultuoso, quase desnecessário. Porque o futuro, para os que comandam o presente, a seu bel prazer e lucro alto, é sempre muito perigoso. V.g.o movimento passelivre, políticanova.

 

Toda novidade é insuportável (Adorno). Perante as indústrias culturais, a arte diminuiu ou, melhor, perdeu sua evidência, seu mistério. É utilidade, fácil embora complexa, aberta, ou está fora, é inútil ao mercado. Se não tem a atenção do mercado, não merece. Adorno esclarece: o novo, quando advem, sua característica é a ausência de intenção, o acaso dita. Se não for ditado do acaso e carregar em si um propósito, uma intenção, tal arte é pra valer, é o novo, sim. Assim recebida com indiferença, ao contrário da situação anterior, com deferência. E o caso da Poesia Absoluta, a realmente moderna, digna do século 21. E estranha ainda aos milhões de alienados e retrógrados leitores.

A dialética de Adorno, preservando a ambiguidade essencial da tradição do que seja moderno, é positiva. O que há de paradoxal na modernidade, dispara Adorno, é que ela tem uma história, mas, ao mesmo tempo, é prisioneira da eterna repetição da produção em massa (como o soneto).

Passou o tempo do modernoso e da velha modernidade arquivada ou transformada em velharia viva. Chegou a época do neoposmodernismo (em poesia).

Valéry dixit: No século XIX, a noção de revolução deixou de representar a ideia de reforma violenta (imposta à bala ou à sílaba) – por causa de um mau estado das coisas, para se tornar a expressão de uma mudança que se impõe enquanto tal, qualquer que seja. O passado próximo tornando-se inimigo. É o caso da estranheza (termo preciso do crítico Antonio Candido) em relação à poesia neoposmoderna ou mesmo da incompreensão, pós Geração 45, do que seja poema livre.

A poesia, por decorrência de um capricho ou má intenção ou ignorância da sociedade burguesa autonomizada (pós era Vargas), no Brasil, deixou de ser uma necessidade histórica evolutiva, prenhe de mutações e novos caminhos, para voltar a ser mero jogo de salões, sorriso da sociedade, coisa de festa de aniversário, demonstração de habilidade silábica técnica do verso, só.

A poesia, como resistência à sociedade capitalista, não como arma social, porém como reflexão do futuro, utopia da palavra, complexidade do presente, rebelião do verbo contra a mesmice consumista, foi obstada no Brasil. O efêmero e o eterno eternos inimigos.

E Benjamim arremata: domesticando-se a história, via construções teleológicas – ou ideologias de progresso (mais material que carnal), oculta-se o futuro (ou o adia), enquanto fonte de inquietação (e motor da história).

A conclusão é que a vanguarda é efêmera (eterna só a arte grega e seu encanto que hipnotizou Marx) e muitas vezes torna-se retaguarda vã; a vanguarda é passageira e válvula de fuga de uma situação a que se impermite o ataque. (No Brasil, já estamos à espera da REVANGUARDA).

A síntese é: a poesia é desconcertante (e o deva ser) por natureza: não é jogo nem brincadeira de salão; não há necessária incompatibilidade entre sua compreensão e seu êxito, embora não exista poesia fácil para ser exitosa; e ela escamoteia o próprio id: é durona.

A suma final é: a poesia absoluta está além das vanguardas e do Kitsch, pois está à frente do tempo (nas duas acepções).

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Murilo Gun

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