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Dom, Jun

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Sentimos prazer com a forma autônoma da poesia, livre, absoluta poesia... e somos por ela energizados liricamente, quando a repercutimos na alma (e o eco não é oco mais) quando a contemplamos improfanadamente na página (essa outra alma branca) a nos alinharmos a ela (a suas linhas virgens ainda) cheia da sedução inexprimível do ser.

Necessidades emocionais (velhas) são bagatelas. Apenas satisfeitas soneticamente.

A verdade nos possui (e passa a nos pertencer) quando nos irmanamos, tornamo-nos uníssonos (corpo e alma um só conteúdo e forma, impressão da expressão) com a forma poética que é interior.  E vem do veio oculto e completo, abstrato e concreto da alma.

Quem faz o poema absoluto não é a vida (apenas), é a pena, a tinta, o espectro branco da página. Não é o indivíduo. É a sociedade livre dos homens presos a usuras e destinos comerciais mesquinhos.

A impregnação estética – ou conformação formal – é uma escapatória, uma saída para o refúgio que se encontra fora da vida informe (e comerciária ou sublimada apenas) do dia a dia. Saída expressa do ou para caixas destituídas de poesia valida (inválidas caixas).

A poesia pertinente para o estético não equivale, ou melhor, não se resume a expulsar o conteúdo (sentido preconstruído) de modo a isolar a forma, mas implica ou remete ao modo como a forma se torna parte (não ínfima, mas íntima e própria) do conteúdo. Numa perspectiva puramente dialética.

A forma não é rastro material, vácuo, mera fenda, bagaço, câmara de liberar pressão, válvula de compreensão, num ambiente ou superfície – ou sistema, subexistentes. A forma é material. O material do poema absoluto, que o concretiza.

BREVIDADE

O poema longo de 3, 4 páginas é de certo modo e visão uma completa incongruência, posto que o lirismo, no processo de criação do poema se louva de parcos (poucas) sentenças ou versos. É uma contradição com a própria definição ou conceituação de poesia, como utensílio de concentração verbal e impregnação lírica.

Poesia é criação pura (e nunca repetição de palavras arranjadas em caixas medidas de sentido). latas de sentido servem para edificação da prosa.

O que é o soneto se não repetição de fórmulas (há 500 anos, desde Camões) já consagradas (como forma), e hoje anacrônicas por demais, embora resistindo como casca idosa.

Em cada poema, hoje, eliminem-se linhas e linhas de versos incabíveis, menos cabíveis, grotescos, excessivos, repetitivos (embora bem congruentes), e o que fica é poema (poesia).

Ao contrário da prosa, uma linha (um verso) do poema deve ser mais do que necessário, mesmo imprescindível ao extremo, deve ser de tal forma insubstituível e expressivo (ao máximo), com tal carga de conteúdo (concêntrico, centrípeto) que possa ser autônomo... e retirado do contexto sem nenhum prejuízo à compreensão ou finalização do poema.

E ser um poema em si (e não em outro e prosaico contexto), de um só (ou só meia) linha. (Monóstico).

Ou contendo ao menos um conteúdo que seja, ...e seja só caminho, não chegada. Passagem, não pódio. Reta e não final. Infinito, enquanto dure.

Chamo à colação (lírica), exemplos não exaustivos, dois poemas.

UNGARETTI: MATINA

‘’D’immenso m’illumino’’.

SERENATA SINTÉTICA: Cassiano Ricardo

‘’Rua morta, lua torta, tua porta’’

OUTRO, do próprio (VCA)

‘’Há vagas para máquinas.

Não há vagas para homens’’.

‘’O vinho da palavra

chama-se metáfora

Sua embriaguez

poesia’’.

Está bem assentido, pois, o non-sense. Ou autônomos (e íntegros) fragmentos poéticos. Ou relâmpagos de palavras arranjadas na página, esse céu vital.

Sintetizando, o poeta deve vencer, superar de vez o ímpeto parnasiano circundado de anêmico, porém arraigado romantismo emocional, e a morte da mente paciente (não passiva) do bom leitor brasileiro. O triunfo sobre tal resistência é épico. Se o for, ou seja, se algo triunfar. Vencer a ânsia de confessar tudo (e publicar o íntimo) e em ordem crescente, de tudo medir e pesar em palavras exatas (e conscienciosas, e belas, mesmo). O exercício do controle absoluto, o cálculo aritmético do verso (que se deva escrever com a mão, não com o coração), a consecução das rígidas regras versificatórias vigentes há mais de 120 anos (e as mesmas). No fim, para o leitor é o mesmo e esperado banquete, cujo prato principal é arrumadinho de rimas.

Conheci poetas (?) que sacrificam uma ótima imagem, um belo e sagaz poema-poema, desprezam uma linha perfeita, só para evitar o tal do pé-quebrado. Quebra o poema em tristes trastes, pedaços horrendos, por razões meramente mecânicas, por questões de silabação (e som final), por motivos extra-poema, para perfeita e mais mecânica ainda aplicação do ‘’regrado rígido’’ e secular, estabelecida não se sabe por quem nem quando. Certamente, pessoas que saberiam não hoje (desde o fim do século antepassado, do segundo milênio ainda) o que é POESIA.{jcomments on}

Murilo Gun

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