(Notas de um leitor fiel)
Por VITAL CORRÊA DE ARAÚJO
“Primeiro encontrar, buscar depois”. Jean Cocteau.
Magníficos a atitude, o programa de vida, a visão existencial contidos nesta síntese de Cocteau.
A volúpia reside no estado ou na construção? Para o autor de BACCHUS, vale mais o dado do q
ue o adquirido. E a prioridade é a do êxtase. Não há dúvida de que a prática é mais importante do que a teoria, porque é fundadora e integra e condição humana, mesmo a determina, estruturalmente. É lógico que o método não deve vir depois, mas é secundário e instrumental. A picareta serve para provar que a pepita existe, mas o veio deve vir direto ao olho do homem. O buril serve para provar que no mármore existe o que o artista sentiu com sua mão e seu coração. O espelho serve para justificar a existência da face e nunca para fundá-la, a não ser os espelhos argentinos do mundo e da vida derivados, pelo fabril artesão de tramas e febril industrial de imagens, Jorge Luís Borges, imaginados. Resgatar a pepita do caos mineral é antes um encontro que uma busca, porque é um dever inscrito na natureza humana, do mesmo modo que o é o achar a forma que mora no mármore e a face que, em última instância, habita todos os espelhos, ou o rosto escondido na máscara.
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Não há vagas para homens. Há vagas para máquinas.
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No início, foi a petição: criação burocrática.
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“A juventude não necessita de ilusões”. Camus.
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Le Corbusier, em 1939, condensava em pequenas frases o revolucionário conceito sobre as formas arquitetônicas e o fim ou a permanência das obras humanas.
“O que perdura nas empresas humanas não é o que serve, mas o que comove”.
“A arquitetura é o jogo sábio e magnífico das formas sob a luz”.
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Para Júlia Kristeva, uma das principais tecnocratas da lingüística moderna, a linguagem poética não é um sub-código, em confronto com o código lingüístico, nem também é um super-código. Segundo ela, “a linguagem poética é abertura para o infinito, ordenada em sistema complementar de códigos, onde a fala opera em liberdade, num espaço lingüístico definido”. Certo!
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A exigência de homogeneidade, em um livro de poesia – e que o embala estruturalmente – deve ser de conteúdo e não de forma.
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O leitor apressado – ou o não leitor – perdeu o prazer de ler, o prazer gratuito do texto, a que se refere Roland Barthes.
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Ritmos severos habitam o fruto.
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“O caramujo suspira
e estonteado se afasta
cheio de confusão
pelo eterno”.
Lorca
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Livre do peso ou do vício do sentido
e do hábito da lógica
ou da doença cartesiana da ordem
a poesia irradia magia
êxtase e sortilégio.
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Sem a dimensão do futuro
o tempo perde o sentido.
O futuro é a condição do tempo
seu alvo, destino e porto.
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“No mar tanta tormenta e tanto dano,
tantas vezes a morte apercebida;
na terra, tanta guerra, tanto engano,
tanta necessidade aborrecida,
onde pode acolher-se o fraco humano,
onde terá segura a curta vida,
que não se arme e se indigne o céu sereno
contra um bicho de terra tão pequeno.”
Camões
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“Tudo o que não procede de uma convicção,
é pecado”.
Paulo, Epístola aos Romanos.
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O futuro é substância
ou alma do tempo.
Sua seiva
são as horas.
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O herói dura
o tempo da queda.
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“Teu vasto coração, Pablo Neruda,
era um país soprado pelos ventos
do mar e pela insônia carrancuda
da alma milenar dos elementos.”
Francisco Carvalho
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“Ó liberdade, brancura do relâmpago.”
Natália Correia
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“É vão aos deuses pedir
o que pode o homem
por si só adquirir.”
Epicuro
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Os mortos dormem, subterrâneos,
sob mármores e pátinas.
Vindos da solidão das entranhas
vão à dissolução:
estranho país imóvel.
Cravos e lápides ornam
suas carnes pútridas
incomensuráveis.
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Sete luas portugueses açulam
os cães do céu.
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A multidão é uma mentira.
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”E logo meus olhos pintaram
um mundo nascendo
entre águas e íris, adivinhando
o mastro liso dos fustes
a gávea sob rodas
as retrancas, as vergas
e os véus de cipó.”
Perse
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“Raio de sol entre dois líquidos diamantes
e a lua a fruir dos trigais obstinados.”
Tradução livre de um dístico de Éluard.
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“Mais um verão, mais um outono, ó Parcas,
para amadurecimento do meu canto,
peço me concedais. Então, saciado
da grega sede, meu oração estanque.”
Hölderlin (fragmento)
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”Vanguarda, hoje, é usar de todos os meios para destruir o pretexto de que a poesia é algo de inefável ou transcedente; é manifestar revolta contra tudo o que o mundo atual quer eternizar, mas é, sobretudo, libertar a linguagem das correlações lógicas e semânticas que retratam a falsidade social e moral”.
Jorge de Sena (Um dos maiores poetas lusos do sec. 20).
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A poesia deve ser inovação permanente, sem desprezo do legado dos grandes poetas, desde Homero, ou antes; expressão sempre renovável sob pressão constante da alta voltagem da linguagem plena de plurisignificados, sob pena de não passar de prosa em traje de gala. A propósito de Cocteau.
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É preciso dar carta branca à imaginação. E não temer o resultado poético. Sob pena de não ser. Poeta e gente. Vida e mundo.
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Gide ou o Desejo. Sartre ou a Esperança Camus ou o Absurdo. Marx ou o Futuro.
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“Tudo o que possui a magia do vidro detém também a sua fragilidade” Sartre.
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“A juventude não necessita de ilusões”. Camus
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“As idéias não são para ser pensadas, mas vividas” Malraux. Esta afirmação do autor admirável de A Condição Humana marca a fronteira entre a ficção e a vida. A ficção deve ser também um ato político, pois o escritor é um homem vivo e de idéias vivas.
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O mais admirável do fantástico é que ele deixou de existir como fantástico: agora, tudo é realidade. De Breton, ao sentir como as pessoas, o mundo, as coisas eram surrealistas, e não sabiam.
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Se queres ser filósofo, escrevas uma novela.
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