A arte poética visa à expressão. Exprime o pensamento. Não é – nem o poderia ser – expressão de (ou do) sentimento.
E o pensamento expresso no poema é pensamento não lógico, embora não necessariamente ilógico. Alógico. E como tal, a poesia não é meio de conhecimento (de si ou do outro). O romance o é.
Em sentimento e forma, Suzanne Langer, teoriza o princípio da assimilação: cada arte é dotada de um material expressivo típico – e independente ou autônomo, em relação à matéria das outras expressões ou domínios artísticos.
Daí, a solução do velho problema de letra de música e poema (ou literatura). Se as palavras compõem ou participam da música, elas não serão poesia, mas elementos da composição musical.
O poema não comunica, pois a função da poesia não é informar. O poema indiz. É ditame da alma, não do corpo ou dispositivo psicológico, fisiológico ou sociológico, para veicular mensagens.
Há sim comunicação através da arte, não especifica, pessoal, direta, imediata, objetiva.
A poesia é uma arte (literária) sui generis: se for capaz de comunicar, o poema não é (nem pode ou deve, como algo artístico) pessoal... e essa “tal mensagem está isenta de ser compreendida, ou é dúbia, ambígua, iliteral.
A poesia absoluta propicia, fornece potência às coisas, embora não exerça mediações entre coisas e pessoas, não sirva de referência a coisas do mundo. Isto é, anula qualquer proximidade entre as coisas em relação ao poema.
Em suma, estabelece uma esquizofrenia entre o objetivo e o subjetivo. Todo o esquizofrênico objetivo da busca de sentido certo, racional, imediato, imperativo é descartado.
A arte (poética) não é uma manifestação subjetiva dos sentimentos, mas um encontro de subjetividades objetivamente.
Desde Gombrich, a relação entre as representações artísticas (incluindo a literária) figurativas e a realidades externa é totalmente ilusória. Daí, a questão do poema referir-se à, ter como referente algo, representar alguma coisa da realidade de cada um etc estar vencida.
Leitor, quando entende o poema de um soslaio de leitura também vira proprietário, o poema é seu, ele o “entende” de pronto... e o anexa. E qual uma atitude capitalista, de apropriação da mais valia poética.
A percepção poética não funciona atomisticamente, isto é, pela somatória dos menores sentidos arrancados das palavras-no-poema, mas numa dimensão de totalidade, em forma de fragmentos íntegros, posto ser cada poema inacabado e inacabável.
Os dados que a palavra expressa são organizados numa estrutura complexa, assimetricamente e em desordem, e essa estruturação verbal gera a forma, determina a dimensão e o valor do poema.
Não se pode ler (ver) um poema (ou sentí-lo) como algo mecânico, direto, claro, clássico. Porque poema é intertexto, mescla de estilos citação (não recitação). Nele, num poema absoluto, intervêm citações, alusões, plágios, réplica, paródia, imitação (ver Imitação de Propércio, de Pound), remissões, conflitos, ironias etc.
O poema vai muito aquém e muito além da intenção do poeta. O que torna o poema óbvio – e fragiliza o poeta – é a vontade de atribuição do verbo ao (mau)dito poeta, desejo de apropriação pessoal da obra.
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