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Dom, Jun

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Há 130 anos atrás, Nietzsche decretou sem pena (com seu cálamo em riste) a morte de Deus, fato que desencadeou o medo (de morrer também) e a necessidade (urgente) de substituí-lo logo (e Logos) antes que as coisas se complicassem por demais... e esse vácuo primo ( o locus vazio) fosse ocupado (porque o vácuo não dura) por velhos e obstinados demos. E também porque: Deus morto, tudo seria (ou nada seria) permitido. A velha questão, antes meramente jogo abstrato, agora se afiguraria prática... após....

 

 

Passado o luto (basto) pela morte de Deus, cabia aos homens inventar uma nova e eficiente moral humana não mais alicerçada em Deus, morto como o Filho.

E (pior) se alguém, no âmbito e na vigência dessa temporaríssima (e abismal) ausência (inominada), alguém – eu ou o outro, se arguísse o direito de ser deus? Imagine, proba leitora, o cu de boi!.

O problema é que, devidamente – e com todos os ritos, enterrado Deus (embora, à exceção de Nietzsche – e possivelmenteo Papa, ninguém fora ao seu inumamento), o Senhor Celeste de todos os Exércitos segue vivo – e bem vivo até demais, mais ainda vivo do que antes de Nietzsche matá-lo com sua prosa fatal e implacável lógica deicida. Morreu sim, louco e sifilítico o pobre Nietzsche, idiota matador de deuses.

Obs. Teste seu conhecimento, cara leitora: a) Deus está morto: Nietzsche.

b) Nietzsche está morto: DeusA ou B?

 

A literatura – parte da totalidade da cultura, é um fenômeno específico, não do âmbito da razão, porém do campo da sensibilidade, isto é, do espírito, característica da alma humana, em sua plena evolução. Não evolução geológica, ou seja, meramente temporal, mas produto de um processo do desenvolvimento cultural (isto é, não técnico ou científico). Cerca de 500 anos antes de Cristo, em especial no século V a.C. e nos começos dos tempos históricos, 100 anos antes e 100 anos pós-Cristo; a literatura (em particular, a poesia) alcançou seu apogeu, em Grécia e Roma.

Outros apogeus ocorreram com Camões Dante, Gôngora, Quevedo,Lope de Vega, Gregório de Matos, Bocaje, durante o maneirismo (cerca de 1500), na época de Goethe, Holderlin, Novalis, Byron, Keats, Shelley, Shakespeare, Blake, Rimbaud, Baudelaire, Laforgue, Rilke, Mallarmé, Valéry, Poe, Whitman, Verlaine... e recentemente uma nova idade de ouro da poesia rebentou no início do século XX (e fins do XIX, na Europa), com a esplêndida plêiade de poetas cubistas, surrealistas, modernista, expressionistas, que grassaram em toda a Europa e Eurásia, América do Norte e Latina. No Brasil, destacando-se dessa estirpe poética Mário e Oswald de Andrade, Murilo Mendes, Cecília Meireles, CDA, Jorge de Lima, Manuel Bandeira, João Cabral, além de Augusto dos Anjos e Cruz e Souza. Mais duas dezenas de iguais e pouco menores, e exausto a lista (ou exaure-se-a).

Portanto, a literatura – e dentro dela, ou mesmo à parte, a poesia, é uma instituição cultural bem diferenciada, peculiar, isto é, relativa ou absolutamente autônoma. Convenções ou mesmo tradições literárias constituem algo ou fenômenos de alta mobilidade, não se sustentando como algo consolidado, desmanchando-se no ar. Poeta que se valha da tradição está traído. É passado. É um coitado anacroniquizado, perdido no tempo, sequestrado pelo passado, descontemporaneizado. A respirar ar degradado do espírito.

A peculiaridade mais intensa e característica da literatura é o fato especifico de que a linguagem, veículo de transmissão da totalidade cultural (ciência, comunicação, discurso, contrato, comércio, amor, afetividade, sociabilidade), não se confine apenas à literatura.

A linguagem, em geral, é o veículo transmissor da totalidade dos elementos e fatores culturais, da qual a literatura é um mero aspecto. A linguagem, veículo-mor da literatura, é intrínseca à cultura.

Daí, a importância de desalinhar isso. Separar os campos. Identificar a literatura. Em especial , a poesia. É uma selva a interpenetração cultural, linguagem, literatura. Esta é parte da cultura e tem na linguagem seu elemento essencial ou instrumento vital.

Então, se a linguagem é comum à ciência, ao jornalismo, ao discurso, à prosa, à comunicação em geral e em todos os seus inúmeros campos, é imprescindível diferenciar desse emaranhado – e bem, a Poesia.

 

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Murilo Gun

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