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Dom, Jun

Sobre Poesia Absoluta
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A poesia é uma pletora de desinformação. Assim

ela dá sua maior contribuição a um mundo

estraçalhado de dados, vulnerável ao dígito

 

 

fisgado numa rede (física, mental, virtual) de informações.

O poeta  parece com Deus: cria do nada.

O poeta mexe com a física do sonho. Ele une

a substância(ou a semente de Carpentier)

E sabe ser o sonho a própria e vital

substância da realidade.

Armado com uma imagem o poeta é o  real

paladino de nossa era. A desomumizar

o estabelecido para sempre. O poeta

poeta demole épocas inteiras. (Ver Joyce

Perse, Pound, Eliot, Dante, Murilo Mendes).

 

O isso de Freud, a sombra de Jung.

A realidade ou aquilo segundo H. Miller

que brota o tempo todo da morte e desintegração

poeta compulsa, distende, engrenha, organiza

(do caos do mundo entende em especial).

Segundo Herry Miller, Edgar Varèse

provou que a imaginação é a ultima palavra. E

não morre.

Miller distingue fé (que é criadora, firme

permanente força humana real) e entusiasmo

(algo transitório, que vem de fora para dentro).

A força sobrepuja a energia do entusiasmo.

O haver do homem sustenta o mundo com suas veias e crenças.

E as veias do mundo, as coisas exatas ou não

Deus fê-las para o deshaver do homem. Embora eles

não saibam disso ainda. Até quando, ò bruto ser

deixareis o homem insabido de Si?

 

Os (maus)ditos poetas de agora usam a energia

sonora da poesia como moldura de formas

vencidas. Os buracos nas palavras são grotescos

abismos brancos, resistíveis, ocos como coração.

 

A música da poesia é aérea, tipo pássaro

de parco contato com a terra.

A poesia hodierna no Brasil

é tipo pedra, ferina, palatável

inocente, recitativa, adjetiva

recalcitrante como bromil rimando com céu de anil

ou bombril.

Não mais ensoamos a palavra

no poema como antigamente

agora suamos no labor aritmético

da contagem exata das sílabas:

deixamos de ser pássaro, para ser ábaco.

A pansonoridade morreu.

O pleroma do tom enterramos.

 

Cada verso é uma molécula da linguagem

dissociável em átomos sonoros primais

e nunca em sílabas métricas e vãs. Ou

algo mecânico e metronomicamente perfeito.

Ouve-se no poema não só o lamento das coisas

mas o vagido das estrelas nascendo

e o urro preclaro de sua morte.

Dos pedaços de hélio, silício, ferro, restos

da matéria das estrelas Deus fez o homem:

E ele não sabemos ainda disso. Pensa ser

um poema parnasiano.

 

Mas isso é poesia? Ou perda simples

da energia poética, dissipada em tais coisas

que Vital Corrêa de Araújo apoda de poema?

 

Poesia é a palavra em liberdade organizada em linhas.

É a palavra em liberdade para ser

e não presa a um dizer.

 

A incondicional libertação da palavra

é a condição sine qua non da poesia.

E para isso é preciso no Brasil

realizar nova revolução porque

a palavra hoje é presa.

Em celas métricas, masmorras vérsicas.

Jângal rimando com ângulo langue.

 

Mas isso é poesia, insistem

milhões fugazes de leitoras?

Como? Se não diz nada.

São palavras (significantes) sem significado

a poesia hoje? Heresia. Coisa de herege vital

da linguagem.

Mas isto é poesia, imprecam

miríades de leitoras ante algum qualquer soneto.

Que tipo estranho de poesia é essa? Diga!

É que as pessoas tendem a categorizar tudo

hoje. Querem dar nome aos bois

mas temem o estouro da palavra pecuária

abalando seres ocos corações reses ruidosas.

Várias me disseram (após ler-me duas linhas):

Isso é literatura? Em que mundo estamos.

Isso é a palavra enlouquecida. Voragem pura.

Lírico delírio (possivelmente), mas

não é poesia “com certeza”.

 

É que o bom gosto musical do brasileiro vai (de mal a pior)

de encontro com o mau gosto de poetas como VCA.

A dissonância é imediata, abalante, fatal.

Cadê a poesia calmante, presa a molduras

métricas ou andaimes? A beleza da estrutura do soneto

cadê?

Cadê a poesia calmante, presa de molduras métrica

ou andaimes rímicos? A beleza da estrutura

(décimoquaternal) do soneto, cadê?

 

O péssimo gosto brasileiro com a poesia poesia

vem do que chamo dialética do estabelecido e da

mudança. O gosto (ou des) parnasiano vem

de mais de cem anos, impávido, calcitrante

imperioso e gratificado. Olavo Bilac é um monstro

sagrado. (Quer dizer é monstruoso sim, e nada sacro).

Há um tabu bem brasileiro da poesia rimada e

bem cuidadosamente metrificada. Pé quebrando

é incompetência, restolho, lixo. É

um tabu potente. As pessoas temem o que não

entendem. E preferem deixar as coisas como são (já

que entendem assim). Deixam como estar para

ver como ficam. Parnasiamente estabilizado.

O estabelecimento poético do parnaso

desde a Geração 45 ressolidificou-se. E prosperou.

E agora vem VCA com a nova

poesia (neoposmoderna e tal). Sacrilégio.

A violar o tão bem estabelecido cânone vivo

e aliado da nova música (a atual MPB). (De

1990 para cá).

 

O que está posto (firme, vivo-morto) é

sagrado. E igual. O que é diferente é mau.

VCA é subversivo, subverte a realidade com

sua poesia sem pé nem cabeça, colocando

o universo poético, o edifício, a empresa

da poesia brasileira pé-cabeça. Ele

prega uma ruptura vital. Especialmente quando

afirma nada há de mais antipoético e ridículo

do qual um recital. A poesia neoposmoderna é

“IN”: ilegível e ininteligível, portanto irrecitável

absolutamente indizível, como soi de ser poesia agora.

VCA detrata acuradamente a poesia

embalsamada de agora, tipo lavagem de porco ou roupa suja

em recinto púbico. As nauseabundas cantigas

“cultas”, de imitadores da poesia

popular (regente, cordel), a verdadeira.

 

Comentando a situação nauseante da música

ocidental (tipo M. Jackson e Lady Gaga, agora)

Henry Miller vem com essa tirada: “Das igrejas

vem a triste nênia do Cristo morto, uma

música que não é mais sagrada que um nabo podre”.

VCA quer, sim, provocar um abalo sísmico (cânico, místico)

na poesia viva, estabelecida, remunerada, acadêmica, depauperada

com as placas perigosas de seu poema raivoso e neoposmoderno

quer obter êxtase vendo tudo se desmilinguindo.

Os bastiões do parnaso caindo um a um ruinosamente. As torres do

soneto e as fortalezas das sextinas ruindo de vez.

Maldito! Quer drogar ou dragar. Todos. De

lambuja. Mas ele não conseguirá leitores para isso:

empreitada de fracasso. Por mais que faça proselitismo das elites.

Há poesia hoje. Mas poesia amestrada. Que

não engorda. Sem catarse infecciosa.

Nos recitais hodiernos (Pe em 1º) há

muito pranto de crocodilo. E lágrimas de

borracha descer às turras dos rostos ouvintes

são suspeitas. Ler é algo velho, não que leitores. Lem é que leitores

superado, desvirtualizado. Díssimo.

 

Quanto mais se martele rima rica

e ritmo binário maior a emoção (da pele, que

arrepia o coração) e mais contentamento

rico (êxtasezinhos) se provoca nos ouvintes pasmos.

(Coitados!).

 

E lágrimas que os olhos de crocodilo do

leitor arrancadas da “fauce”, fabricadas em

série pranteal, extirpadas do rosto estático.

 

Lágrimas inconsoláveis e geladas

mas lágrimas. Da audiência. Recitálicas.

 

{jcomments on}

Murilo Gun

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