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Cláudio Veras

Fazer um poema soa muito mecânico. As pessoas costumam dizer: faço poemas, a três por quatro. Ao poeta como criador foi sobreposto o poeta como compositor.

Isto é, o poeta não faz, não cria, mas compõe o poema. Goethe odiava a ideia do adjetivo composição aplicada à poesia e resmungava contra o substantivo composição, que Valéry considerava como ideal. Mas compor ficava meio vago, por sua essencial anfibologia. Então chegou à cena crítica o substantivo Construção suscetível de uma única determinação. E ficou. Na arte e na literatura. Tal como sistema e estrutura, construção é vip (vera e importante palavra). O construtor é um criador livre formal simultaneamente. Eis a tríade construtivista da poesia mundial: Poe, Valéry e Cabral. Para eles o poema é cálculo e acaso. Imolam o objetivo, mas são precisos. O referente superam, mas são fieis a uma realidade íntima mas pública.

 

A criação vem de Deus, a construção vai ao Nada. Como novo Arquimedes, o poeta construtivista só precisa de uma palavra de partida para alavancar o poema. De um cálculo subjetivo, de um ponto de vista pessoal – e exato destituído da emoção que é algo do ego. Para o poeta construir seu poema (fazer mover a composição, como Cabral) é vital um plano ou projeto. Dai que Poe se dizia engenheiro literário. Deus abolido como criador do poema, a inspiração foi ao ralo, o mistério e a espontaneidade idem.

E se vai célere na direção da Poesia Absoluta, além dos ídolos da geometria e dos cálculos exatos do acaso, das plenitudes do verbo, da nova construção da poesia desgarrada dos vícios das vanguardas, muito além da poésie pure – e, ao lado dela, está o absoluto da poesia. O que faz a poesia absoluta e lhe imprime dianteira em relação à arquitetura, v.g., é o fato da poesia destituir-se de fins práticos. A práxis da poesia é ela mesma.

A poesia pura prolifera. Assim como a pintura. A arquitetura recuou frente à exigência capitalista da praticidade. A construção arquitetônica pós-moderna foi ao limite já. Pois fantasia demais e demais criação subjetiva afeta os índices bursáteis. Torna-se impraticável. Porque invendível.

O poeta absoluta entrega-se de corpo, sal, sêmen e alma à fantasia. Renuncia a objetivos e ao real (não absoluto, banal, comum). Sai do campo do dever ser para o do ser. A poesia absoluta é. Não significa.

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Murilo Gun

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