Georg Heym nasceu na Silésia em 1887, doutorou-se em Direito pela Universidade de Berlim, em 1911,
quando já havia publicado a primeira coletânea de poemas, Der ewige tag ( O dia eterno). Morreu aos 25 anos, em 1912, enquanto patinava num lago de Berlim, ano em que vem à estampa o livro póstumo Umbra vitae.
Visões demoníacas mescladas com o horror da morte frequentam sua poesia forte. O suicídio de Ofélia, a execução (ou justiciamento) de Robespierre e Capet e o magistral poema Der krieg (A guerra) encenando expressionísticamente uma catástrofe bélica, numa premonição formidável da Primeira Guerra Mundial que desataria em 1914, porfia que não sofreu na própria carne (pressentiu na alma), mas expressou com força e precisão.
Diretamente influenciado por Rimbaud, a poesia de Heym cultiva a violência expressiva, renunciando à poesia de musicalidade trakliniana e à exultação de Stadler.
O fato de não ter aderido ao versolibrismo tem por efeito multiplicar a tensão interior dos poemas ao compactar neles a força reprimida da expressão levada ao ponto de explosão sempre.
Mantendo a ortodoxia sintática e estruturando conservadoramente o poema, alicerçado num estrofismo clássico, distanciado do verso livre de Stadler, Trakl, Benn e Stefan, Heym compensava esse “bom gosto”, abrindo as porteiras semânticas, optando pelo delírio do sentido, gestando imagens provocadoras, mesmo escandalosas. As metáforas exóticas, desde Rimbaud, passaram a apresentar índice de modernidade. Vê-se da poesia heymeana que o expressionismo não é menos audaz que o surrealismo no garimpo de formas semânticas heterodoxas ao limite.
Exemplo de poesia apocalíptica é o poema A guerra, em que Heym personifica o cortejo bélico “que se levanta do sono falso alçando-se de abôbadas profundas, grande, ignorado, ergue-se com o crepúsculo, animal noturno, e esmaga a lua com sua negra mão”.
E finaliza, premonitoriamente:
“O escombro toca o ombro do homem
rugido deletério invade a rua
para perguntas não há mais respostas
empalide o rosto sob rugidos de ferro
lá longe débil se ouve sinos de tiroteio
o pelo da alma treme, range o instinto
rubros estão os rios de sangue
mortos sem conta flutuam entre juncos negros
corvos se acantonam nos campos
onde batalhas supuram
a dor devora bosques
folhas de fogo saltam das árvores
ferve a raiva, pátrias se escalavram
sob os vértices das nuvens
vertigens de tormenta se erguem
e o mundo torna-se uma Gamorra”.
É patético – e antilírico – o primeiro verso do poema Ofélia, de Heym:”Ninhada de ratos d’água se alberga em seus cabelos”
Trakl e Heym são mestres na complexa operação de evocar passagens que encarnam estados psíquicos.
Trakl desenvolveu um modo peculiar de cenário desolador (pesadélico, mesmo) como um correlativo externo de suas agudas ansiedades e secretas.
Trakl detinha da realidade uma visão alienante (e negra, mesmo), mas esse tipo de subjetivismo é bom representante da concepção expressionista do mundo e das coisas da vida.
Heym e Trakl foram leitores precoces de Rimbaud, sendo nítida a influência que o vidente deixou na forma de escrita expressionista. Rastro que todos nós estamos seguindo.
Alguns críticos desavisados tentaram enquadrar G. Heym como pré-expressionista, condição logo repudiada, desde que Heym é, juntamente com Ernst Stadler e Georg Trakl, fundador do movimento, com seu livro Dia eterno, publicado em 1911.
Um certo conservadorismo formal e o recurso a formas poéticas em desuso como o soneto confundiram os críticos da época, mas de modo nenhum o distanciam do expressionismo, ao contrário, seus poemas, independentemente da forma, são cruamente expressionistas.
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