Cernuda foi presa fácil da consciência do desejo impossível, abandonando-se à aventura do corpo por desvãos sem rumo, tal como Kavafis às noites lascivas de Alexandria.
Até que Cernuda soubesse que a carícia era mentira (de seu verso em Prazeres proibidos), ele acreditava no amor. Depois, o desprezo se apossou dele, em Londres e no México, lugares em que pousou sua alma perdida nos saguões da carne.
No entanto, a lucidez poética se avolumou, à busca do exata da palavra se devotou, expandiu ou arrostou os limites do verbo, desvendou os sonhos, antes de sonhá-los.
Os mortos de Lorca (depois, o próprio Lorca, assassinado por Franco: impune até hoje), os homens desabitados de Alberti (Sobre os anjos), o tudo foi naufrágio de Neruda (sobre o Amor deserto), o vazio de ser em tempo de cólera, de Marquez, tudo Cernuda sentiu, distilou e destinou ao urdume do poema.
A REALIDADE E O DESEJO.
“Que ruído tão triste e estranho
dos corpos quando se amam
estraçalhando lençóis e intimidades”.
Ou: “Mãos rápidas, atentas, obscenas
feixes de mãos que foram um dia
flores do jardim de uma abertura lasciva”
são provas da sensualidade pura de Cernuda.
Poeta a quem a realidade impediu o desejo.
E sua morte tão cedo foi efeito da derrota do sentimento.
{jcomments on}