Tudo é e nada é. Heráclito
O inferno são os outros. Sartre
O nada é tudo que eu tenho. V.
Tudo é ilusão e a ilusão é uma ilusão. Fernando Pessoa
Poucos atravessam as portas da percepção
muitos encontram no fim do seu périplo
os portões do inferno, alguns poucos
alcançam o limiar dos portais um tanto oxidados do paraíso
mas morrem de êxtase na praia
ante as masmorras do mal sucubem
mas assim não está escrito
nas linhas da mão nem nas páginas do coração:
porém na testa do destino
que as moiras estrelam
de treva e martírio. VCA
Empurro para baixo minha pedra
sou Sísifo, embaixo está o rio
e é mais fácil descer até o início
(que é o mesmo fim) diminuindo a pedra
e as minhas mãos (diminuindo a vida)
vendo as fotografias ao contrário
(mais novo em cada uma) vou cantando
sobre as flores (que a terra está florida)
e eu não sou mais poeta, sou menino.
Última estrofe do lírico-épico
poema Sísifo, de Marcus Accioly,
onde o poeta assume ser o mito.
EPÍGRAFES DE MARCUS ACCIOLY
Da nossa vida em meio da jornada
entre armas e barões assinalados
tendo perdido a verdadeira estrada
vi-me por mares nunca navegados
selva selvagem Tróia incendiada
muitos heróis nas guerras esforçados:
Aquiles, Odisseus, Vascos e Enéas
ó comédias tragédias epopéias.
1ª estrofe da abertura do épico-lírico
poema Sísifo, de Marcus Accioly
(Dante, Virgílio, Camões, Homero,
Hesíodo e Jorge de Lima são aludidos)
Quando a vida não define a arte
a arte define a vida: se não posso escrever
tudo o que vivo, vivo tudo o que escrevo.
O poeta tem que ser ele todo, para que seja ele mesmo
e ser ele todo significa ser ele um-todo.
(do manifesto do Realismo Épico)
Ó Salvador Dali daqui de onde
o mundo abre as janelas para o onírico
portas azuis do inconsciente
reveladas por Sigmund Freud
realidades irreconciliáveis
como um mergulhador e um guarda-chuva
mas possíveis de ser (como demonstras
nessas frias paisagens absurdas).
1 Sego onde não semeei e colho onde não espargi
São Mateus
2 O grão de mandrágora na boca do vivente o irrealiza, na boca dos mortos os gravita.
Lezama Lima
3 Perto da dor de uma tarde morta enterrada na noite, estou.
Vital Corrêa de Araújo
4 Inspiração sem dom é só nada ao cubo. (sobre o dom poético ou quem o tivesse).
Vital Corrêa de Araújo
5 A qualquer um que tivesse, lhe será dado e terá mais; e, ao que não tivesse, mesmo o que tem lhe será tirado.
São Mateus
6 A poesia não resiste à aridez da América. VCA
7 Casanova, Onan, Sade, Masoch, que felizardos! Seus nomes, assim como suas proezas, não envelhecerão jamais.
Cioran
EPÍGRAFES DE LEZAMA LIMA
- O poeta é o guardião dos três grandes privilégios ou temeridades concedidos ao homem: a conversão do inorgânico em vivente, da substância (ou matéria) em espírito pela penetração do alento do demiurgo, ato nascente de transubstanciação, superação da potência aristotélica em puro nascimento; o inexistente hipostasiado em substância, e a existência total ganha pela superabundância da ressurreição.
- Se pelo alento o corpo toca num ponto o invisível, ao alcançar a substância do inexistente sua expressão, na sentença poética, é como se pelos olhos nos pendurássemos num ponto.
- A poesia é esse porto órfico, essa respiração que se move entre o corpo e um espaço, como o da aranha ao tecer âmbito e feitiço.
- Maiakovski, que é de certo modo o Hesíodo da poesia moderna, estabeleceu, como condição primeira para a realização do trabalho poético, a existência, na sociedade, de problemas, cuja solução só pudesse ser imaginada por meio de imagens poéticas.
Astrojildo Pereira (crítico literário)
- A irrupção de expressões prosaicas no verso – que se inicia com Victor Hugo e Baudelaire – e a adoção do verso livre e do poema em prosa foram recursos contra a versificação silábica e contra a poesia concebida como discurso rimado.
Octavio Paz
- Nem todo poema – ou, para sermos exatos, nem toda obra construída sob as severas leis da métrica – contém poesia. Um soneto não é um poema, mas uma forma literária, exceto quando esse mecanismo retórico – estrofes, metros e rimas – foi tocado pela poesia.
Octavio Paz
- O ceticismo é a elegância da ansiedade. Cioran
- O homem do século vinte sobrevoou o Olimpo de aeroplano.
Astrojildo Pereira
- Os poetas são uns diabos extraordinários, possuidores de faculdades especialíssimas, que lhes conferem poderes de percepção extremamente sutis. Eles vivem um constante estado de graça, que lhes permite atingirem a essência das coisas.
Astrojildo Pereira
- O temor da esterilidade leva o escritor a produzir como ratos.
Vital Corrêa de Araújo
- Quase todas as obras literárias são feitas com clarões de imitação, estremecimentos fingidos e êxtases roubados.
Cioran
- Neste “grande dormitório”, como um texto taoísta chama o universo, o pesadelo é a única forma de lucidez.
Cioran, o romeno.
- Existe na estupidez uma gravidade que, melhor apresentada, poderia multiplicar a soma das obras-primas.
Cioran
- A poesia é a festa da inteligência, segundo Valéry, e a dança do intelecto entre as palavras, na visão demiúrgica de Pound. Com Baudelaire, a poesia passou de um destino a um castigo (ou maldição). Enfim, o poeta tem que ir à medula do sonho, e de lá trazer palavra de ação poética, que é a mais eficaz. O poema como operação da inteligência foi conceituado por Poe, segundo Marcus Accioly.
Vital Corrêa de Araújo
- A irregularidade é a parte principal da beleza. O belo estético é o inesperado, e a espera do ritmo é algo vago.
Baudelaire
- É na ambigüidade que a poesia se torna criação.
M. Blanchot
Fracassar na vida é ter acesso à poesia – sem o suporte de um talento.
Cioran
- Só os espíritos superficiais abordam idéias com delicadeza.
Cioran
Sob toda obra completa, jaz um impostor.
Cioran
- Baudelaire tinha o profundo sentimento de que o horror de viver não pode ser consolado pela morte nem substituído pela glória de ter algo. Não há nada que esgote ou anule o horror de existir, de ser, que é a existência, que tem como principal significação o sentimento de que nunca se deixa de existir, não se sai da existência, existimos e pronto, e sempre existiremos até a exaustão de Deus, o que é revelado por esse horror. Exemplo: Mostrar que até na cova o sono prometido não é certo / nada é traiçoeiro / a morte mente / há projetos esquisitos / mais carne para o espírito (Baudelaire). Pois busco o vazio, o escuro, o nu.
- Portanto, não se deve contar com o nada para terminar.
Maurice Blanchot.
- Valéry censurava Pascal por estar exageradamente desesperado e expressar por demais perfeitamente esse desespero.
- É no sepulcro que Jesus assume uma nova vida, não na cruz. Na Terra, Ele só teve o sepulcro como repouso. Seus inimigos só o deixaram em paz no túmulo.
M. Blanchot.
- Não odeio em mim essa imensa amargura / de não ter achado o fogo que me consome / tudo sufoquei / ofereci os triunfos da carne / a tantos vis troféus.
P. Valéry
A linguagem de Eliot recolhe a dupla herança da prosa e do lirismo: despojo de palavras, fragmentos de verdade, o esplendor do renascimento inglês(com a revolução industrial saindo das entranhas da velha Álbion) aliado à miséria e à aridez da urbe moderna.
Octavio Paz.
O mundo moderno perdeu o sentido, e o testemunho mais cru dessa ausência de direção é o automatismo da associação de idéias, que não está regido por nenhum ritmo cósmico ou espiritual, mas pelo acaso. Para o homem moderno, tudo lhe é estranho e em nada ele se reconhece. E, quando toca outro corpo humano, não roça o céu, como queria Novalis, porém penetra numa galeria de ecos. As Flores do Mal, de Baudelaire, originalmente era Limbos, e Terra Devastada, de Eliot, não representava o inferno, mas o purgatório.
Octavio Paz.