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Sáb, Maio

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                                    VCA
            Se a busca da poesia absoluta é para integrar leitor à irrealidade, isto é, afastá-lo do imediato real ordinário, falso, aparente, imutável, ela é, no entanto, extrema extremamente afável com o futuro da palavra. Se a impermanência – e não o trânsito – é angular ao poema absoluto, é que se crê que o que permanece apodrece.

            O sentido da existência é uma utopia ainda. Porque tal existência humana é primária, imperfeita, defeituosa... e como tal não pode ter sentido. É um precipício sem beira, uma borda ainda irrespirável, como diria o saudoso mestre Oswaldino Marques.

            Havia (e ainda há) uma pasmaceria, um acordo de não acordar, um consenso de que a poesia vive o melhor dos mundos... tal como Cândido Voltaire... e a academia é a glória etc. Fora de forma acadêmica, é pura anarquia. O reino da rima eterno. Como, se dor não rima com solidão?

            Essa calmaria leva a lugar algum. E assim é. É a poesia essa linha bilaqueana infinita? Nada disso. A explosão, a irrupção da poesia absoluta, que começou no complexo universitário FAMASUL, em Palmares-PE, que serve a toda a vasta e verde Mata Sul, foi o fato voraz que renovou o campo já seco de tanto ceifado, a messe sem vida da poesia velha, vencida, adiada apenas.  E ninguém, após experimentar o poema absoluto, vai dizer: nada aconteceu, tá tudo nos conformes. O desconforto é grande, mas Murilo Gun dixit: A zona de conforto. Anula, nela nada se cria, tudo se conforma. Fora do conforto, tudo se transforma.

            Conformação ou transformação, através de nova forma nova, para libertar o lirismo preso na garganta do poeta brasileiro há cem anos.

            Liberdade lírica, desarme de rima, desarrumação do andor parado, poema absolutamente poesia.

            É fajuto aceitar que a comunicabilidade da poesia é função de versos racionais e explícitos. E que o trobar clus é desordem, etc. A bem de uma rígida ordem parnasiana, nega-se a modernidade, desde a Geração 45.

            A forma como invólucro do conteúdo passável é idiotia temerária. A forma, para propiciar conteúdo explicativo, racionalizável, é balela. Forma e conteúdo, sentido e expressão são uma mesma e só coisa. Só mecanicamente se pode separar esse elo dialético.

            A superstição da rima é algo arrasador.

            Não se pode buscar o fundamento da poesia, sua essência, e a verdade do poema, fora da poética, na política, psicologia, sociologia, religião etc.

            O poema é um ilimite. É um limiar ilimitado. Daí o fantoche da incomunicabilidade ser queimado pelos poetas poetas.

            Uma vertente infeliz é a que se reserva ao descaminho entre prosa e poesia. A distinção mecânica, em especial, pelo relevo: verso=poesia, texto contínuo=prosa, é inútil e nociva, pois confunde ao invés de aclarar.

            Uns confundiram prosa e poesia, considerando poema como confissão fosse do que fosse, feita de qualquer maneira (vide o velho e erudito Adolfo Casais Monteiro), pelo poeta ou interposta pessoa. Daí, os derrames “líricos” a verbogear.

            O busílis era que se fazia prosa rimada e medida, denominando tal prosaicismo salteado poesia, como até hoje. Pegue qualquer soneto, coloque em linhas corridas, estique, em texto prosaico, e haja história de amor ou não, com começo, meio e fim, tudo certinho e entendido, indubitavelmente poema.

            99% dos poetas brasileiros, então, fazem prosa pensando ser poesia: são pretas... prosaicos.

            A questão poesia é mais que algo formal, é estrutural. (Fugir de realidades perversas, como a brasileira, é ótimo).    

           

 

Murilo Gun

 
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